Toda noite é a mesma coisa: quando ouvem o ruído da
primeira janela sendo fechada, começam a retornar do quintal. Há quem diga que
gato não se educa, pode ser, mas eles se acostumam com a rotina e sabem, por
instinto, que necessitam dos hábitos diários, para garantir a comida, a água, a
cama quente e o cafuné. Quando as janelas se fecham, quem ficar do lado de lá vai
passar perrengue.
Filó é quem mais conhece sobre passar a noite fora. E de
tanto sair correndo ao invés de entrar quando chamada, ficou no quintal
diversas vezes, até entender que janela arriando é sinal de baixar a bola,
caçar o rumo de casa e entrar pra dormir (ou não).
Chico é muito apegado à comida. Tanto, que aprendeu mais
rápido que a Filó. Quando chego na janela, se estiver do lado de fora, põe-se
em alerta no banco da varanda. Chora, mia, faz manha e, como não tem jeito,
cede. Vou descendo a janela devagarzinho, ele roça os bigodes na grade, em
seguida a cabeça, pata após pata e o salto no chão. Mais esperto que a Filó,
sabe dar a volta por cima do telhado ou pelo muro da vizinha e entrar pelos
fundos. Se estiver chovendo, estará em apuros, por isso preferiu se acostumar
com os horários dos humanos.
Gatos são selvagens, ainda não estão totalmente adaptados
à domesticação. Já dependem da comida dada, porém não perdem a independência e
o temperamento altivo. Fazem o que querem, na hora em que querem e do jeito que
querem. Não adianta insistir em domá-los. Por outro lado, são capazes de se
adequar perfeitamente aos costumes da família.
Flora sente o momento em que vou subir para dormir e fica
de prontidão no primeiro degrau da escada. Ao menor movimento meu, sobe
correndo e me aguarda na porta. Abro, ela vai para debaixo da cama, espera que
seja aberta a porta do banheiro. Salta na pia e com um miado chorado, pede água
da torneira. Parece sede de uma semana. Enquanto tomo banho, ela se satisfaz.
Depois, deita no tapete, assiste ao meu banho e por ali fica até de manhã, quando
também desperta e desce comigo.
Zoraide é minha Garfield. Come, dorme, faz suas
necessidades, toma sol. Tem preguiça de pular a janela; às vezes fica na porta,
pedindo para entrar ou sair de casa. Aparenta não atentar para o mundo a sua
volta, embora saiba sempre onde estou e anda atrás. Se me sento no sofá na
sala, ela vai pro tapete; se estou na cadeira do quintal, se aproxima e deita
perto; se trabalho à mesa do escritório, ela deita no meu pé. Não gosta de ser
comandada, como a Flora, no entanto reconhece, como os outros, a hora de se
recolher. Basta que se diga “bora!” e ela atravessa sala e copa, passa pelo
buraco da grade da área e encontra a cama.
Durante a noite, os quatro sabem que a comida fica na
área de serviço. De manhã, esperam seus pratos no chão da copa. Quando terminam
de comer, as janelas estão novamente abertas e bora se refestelar no sol!
Comecei a desenhar esse texto, enquanto aguardava a
última entrar. Sim, a Filó, enrola do lado de fora, se fazendo de difícil. Logo
entra desfilando na cozinha, olha na minha cara, mia. Acabei falando de cada
um, porque fazem a minha alegria diária, são brincalhões e, mesmo brincando,
são parte do meu silêncio. Prezam sua independência, autonomia e liberdade, ao
mesmo tempo em que demonstram amor incondicional a quem tem condição de perceber
esse amor e se dispõe a recebê-lo.
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