- Mãe, sobe aqui, rápido! Você precisa ver isso!
- Que é? Está me assustando!
- Sobe, depressa!
Ele me mostra, da janela do quarto, o céu roxo que
adoro, prestes a desabar em chuva. É quase possível sentir o peso da água, que
a força da gravidade empurra pra baixo. Esqueço o estava fazendo e paro. Fico estática,
diante do espetáculo que vai transformando a paisagem rapidamente. Admiro o
contraste com as copas das árvores, com os telhados, os muros. E me causa
imenso respeito o silêncio da natureza, a prenunciar a tempestade que se
aproxima. Nem um pio da passarinhada costumeira.
A ventania traz as folhas da árvore em frente pra
dentro do quintal. Roupas voam na corda e pra fora dela também. Aos primeiros
trovões, ainda ao longe, os bichos de casa pressentem que lá vem problema e caçam
cantos pra se esconder. Ouvem-se vidraças que se fecham na vizinhança e a mãe
que grita à filha: “Essa porta batendo aí!”. E o que há pouco era nuvem
encorpada desaba sobre nós.
A casa é quietude. Do sofá, através do vidro que
ainda escorre, vejo gotas remanescentes da chuvarada de há pouco. O tempo para;
já não há mais vento. Agora é calmaria. Não há som ligado, nem TV; os bichos
dormem em volta. Silêncio ruidoso: na rua, passarinhos celebram o cair da
tarde. Brincam nos galhos úmidos, tomam banho nas poças das folhas, fazem
algazarra na água que desce pela canaleta. Passa um carro, passa outro, e se
vai distante o ronco do motor subindo a rua até sumir. Ora uma criança dá sinal
de vida num apartamento, ora um cachorro late ali embaixo.
Vem da cozinha o recomeço após a chuva. O movimento
que já conheço da leiteira no fogão, do acendedor, a tampa. A torneira aberta
lavando a garrafa. A gaveta de talheres, o pote que é aberto e em seguida fechado.
Canecas retiradas do armário. O aroma inconfundível.
- Mãe, tá rolando um café fresco, vem pra cá!
.
.
Nenhum comentário:
Postar um comentário