Na cerimônia de encerramento do ano na escola, o
auditório lotado ouve a execução do Hino Nacional. Ao final, por não mais que
dois segundos, paira a dúvida: “aplaudir ou não?”. E se escuta, em algum canto
do recinto, as palmas, meio tímidas, indecisas. A maioria permanece imóvel, silenciosa,
vai-se sentando devagar, enquanto outros continuam aplaudindo, mesmo que de
leve. O mal estar é geral; muitos recriminam, com olhares e narizes torcidos. Outros
apenas se riem da dúvida que nos acompanha há tantos anos. Afinal, é ou não proibido
aplaudir nosso Hino?
A Lei 5.700, de 1971, em seu artigo 30, estabelece que
“durante a execução do Hino Nacional, todos devem tomar atitude de respeito, de
pé e em silêncio”. Em parágrafo único frisa: “É vedada qualquer outra forma de
saudação.”. Já um amigo historiador garante que tal exigência, mesmo prevista na
lei, seria um dos exageros cometidos pela Ditadura Militar, que proibia os
cidadãos brasileiros de se manifestar por seu próprio Hino. Claro que uma
atitude desrespeitosa seria inaceitável, mas aplaudir, por que não? Afinal,
bater palmas não é ofensivo; ao contrário, é uma manifestação de
agrado, portanto, nada impediria que o cidadão aplaudisse com a alegria de sempre, quando ouvisse o verso final “Pátria amada, Brasil!”, só faltando mesmo um "êêêêê..!".
São ainda as heranças da ditadura.
Proibições e posturas como essa nos foram ensinadas nas
extintas disciplinas de Educação Moral e Cívica (EMC) e de Organização Social e
Política Brasileira (OSPB). Quem é da minha idade ou mais velho se lembra
disso. OSPB, inclusive, foi inserida no ensino médio, em substituição à
filosofia e à sociologia (!). E nós éramos doutrinados como vaquinhas e
carneirinhos, com professoras megeras que puxavam nossas orelhas, mandavam
calar a boca ou nos deixavam de castigo olhando para um ponto no quadro negro,
de costas para a turma, caso perguntássemos, simplesmente, o porquê daquilo
tudo.
Ao estudar mais a fundo este período da história do
Brasil, posso entender o comportamento de um professor que tive no antigo
ginásio, em uma escola estadual. Ele dava aulas de OSPB (tive esta matéria
nesta fase), mas os encontros com ele eram no mínimo esquisitos. Entrava na
sala, cumprimentava-nos educadamente, sentava-se, escolhia uma de nós, alunas,
a quem entregava um caderninho brochura surrado, no qual havia um questionário
com dezenas de perguntas e respectivas respostas, que passávamos no quadro para
a turma copiar. Ao fim do período letivo (bimestre ou semestre, não lembro)
todo o questionário já havia sido passado aos alunos e, então, devíamos
decorá-lo, pois as perguntas da prova seriam extraídas dele. E só. Sempre
lembrei este professor com raiva, mas hoje imagino que ele, quem sabe, seria um
rebelde, que não podia abrir mão do magistério, e dava aulas daquele jeito, só
para cumprir a tabela.
Também naquele tempo tínhamos as irritantes aulas de
Educação Artística. Era mais uma disciplina sem sentido, que em nada se
aproximava de arte propriamente dita. Aprendíamos a decorar potes de vidro, com
motivos florais, rendas e babados, para serem utilizados na cozinha, e ainda a
fazer capas para cadernos de receitas, com tecidos de bolinhas e outros
apetrechos. Ou seja, mais doutrinação, neste caso, específica para que a mulher
não esquecesse seu devido lugar. O pior é que a maioria aprendeu, ui!
Hoje em dia, em muitos eventos, constato que os mais
jovens estão nem aí para a tal proibição de aplaudir o Hino Nacional; se
estiverem a fim, batem palmas com vontade. A isso conheço por apropriação. Como
esta galera não conheceu a ditadura e sua dureza, pode e deve considerar o Hino
como seu e aplaudi-lo quando tiver vontade. Confesso que ainda me sinto travada
nestas situações, porém ainda está em tempo de reaprender. Vou ali tomar umas aulas
com meu filho e já volto.
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Um comentário:
Esse hino me emociona! Imagina num estádio lotado, em plena Copa do Mundo, ouvir esse hino e ficar calada depois? Sem expressar nenhum sentimento? É impossível. Vams bater palmas sempre para nos lembrar que somos brasileiros!
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