Quando era
criança, até pelo menos uns dez anos de idade, minha mãe determinava a hora de
dormir. Quase nunca passava das nove. Não tinha “Ah, mãe!”. Era vai deitar, tá
na hora, leite e cama. Raras vezes podia esticar um pouco, quando tinha visita em
casa, às vezes aos domingos, mas a rotina era a de encerrar cedo a função. Minha
mãe dizia “Não!” com tamanha segurança, que não deixava clima e nem espaço pra
retrucar; a gente simplesmente obedecia. TV? Só desenho animado, de manhã,
sessão da tarde, se não tivesse dever de casa, e novela das seis ao lado dela.
Tal modo de
determinar regras talvez fosse um meio de evitar que visse coisas que ela não
queria que eu soubesse, como sexo, violência, morte, outros valores que não os
dela ou, ainda, algo que ela não quisesse ou não soubesse explicar.
Fosse o que
fosse, a escolha sempre foi dela e do meu pai em definir os rumos da educação
dos filhos. Hoje discordo e muito da criação que tive e dos valores que me
foram passados, porém concordo com a firmeza em decidir o que fazer, como fazer
e bancar o que determinavam. Eram pais e assumiram com tudo a responsabilidade.
É notável e
cansativa a discussão a respeito atualmente. Pais e mães, sem o menor
constrangimento, expõem para o mundo que entregam a educação dos filhos para programas
de televisão e reclamam nas redes sociais de novelas, filmes e desenhos
animados. Não acompanham, não veem, não limitam, não dizem “não pode”, e a
culpa pelo “errado” que os filhos assistem é da TV.
Também os
protegem de conhecer a vida. Também os escondem dentro de ambientes pseudoseguros.
Pensam que as crianças vão crescer sem saber o que é sexo, drogas e rock in
roll. Eles não só vão saber como vão aprender sozinhos, com colegas da escola
ou nos canais proibidos que acessam quando não há ninguém em casa ou no youtube
pelos seus celulares. Também não
conversam - é mais fácil esconder, não falar, não explicar, não mostrar o que
ocorre na realidade e xingar e esbravejar contra a programação das TVs,
exposições de arte, música, filmes e o escambau.
Com cinco anos
meu filho ouviu de um amigo na escola como um casal fazia filhos. Chegou em
casa e logo perguntou: “Mãe, como é que faz isso? O fulano disse que...” Sentei
com ele e expliquei, na melhor linguagem possível para o entendimento de uma
criança dessa idade. Com o tempo foi entendendo mesmo, com todas as letras. Aos
nove anos me perguntou como os homossexuais faziam sexo. Devidamente explicado,
ali na hora, tim-tim por tim-tim. Soube o que era pra saber e obtive como
resposta apenas um “Ah, tá”.
Meninas de
treze, quatorze anos, de classe média, estudantes de colégios particulares caríssimos
estão fazendo aborto. Meninos a partir de onze anos, de mesma classe e escolas
estão sendo apresentados à maconha, ao LSD. Em festas de quinze anos não é
difícil encontrar embalagens do famoso docinho nas lixeiras dos banheiros. Ouvi
há poucos meses, da boca de um ginecologista, olhos nos olhos, o quanto ele ficara
assustado ao atender, numa segunda-feira, uma menina de treze anos, classe
média de bairro de rico, toda machucada por ter disputado com as colegas quem
delas “daria” mais na festa do clube no sábado anterior. A mãe só fez chorar
durante toda a consulta.
Enquanto isso,
a hipocrisia está nas redes e nas ruas cuspindo discursos morais completamente
fora de contexto para a realidade que se vive no momento. É justamente o que
parece não se ter em casa que tem levado a situações tão preocupantes, tanto de
crianças sexualizadas e drogadas tão cedo, quanto de pais e mães que, cegos
para a própria realidade familiar, saem por aí agitando a bandeira da moralidade.
No mínimo uma incoerência pra lá de lamentável.
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Um comentário:
O preconceito, o egoísmo e a hipocrisia cegam e deformam a humanidade que deveria reinar nas pessoas.
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