13 de janeiro de 2014

Encontro na Vila do Sol

Pequenas coisas com valor enorme
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Convidada para fazer uma palestra para os hóspedes do Residencial Vila do Sol, no Rio, passei dias tentando encontrar um meio adequado de dizer a uma plateia composta por idosos na faixa de 80/90, como atravessei o meu tratamento contra o câncer de mama. Ciente da minha história e do relato que fiz em livro, a psicóloga da casa me pediu que compartilhasse a experiência. A questão: o que vou dizer para pessoas tão mais experientes, que já viveram de tudo e que, teoricamente, estão à espera, apenas a espera..?

Falar do que vivi para grupos de mulheres, por exemplo, é como somar dois e dois. Estou com 45 anos, normalmente o público a quem me dirijo está na mesma idade, pouco mais ou pouco menos, portanto, em tese, estaria assegurada a troca, o entendimento imediato, sem enfastio, do tipo “o que esta garota (pra idosos eu seria, sim, uma garota) pensa que pode falar pra mim, com 90 anos?”.

Pois fui convencida de que sim!, os hóspedes da Vila do Sol estariam receptivos a me ouvir e que a forma como aceitei e venci a doença seria um exemplo pra eles. A rotina por lá em nada se assemelha ao que conheço dos asilos tradicionais. Ninguém está ali apenas para esperar, como dito no início desta conversa. Ao contrário de outras casas em que já estive, diariamente tem atividade, para as quais há estímulo permanente. Há motivação para que tenham projetos, para que façam planos, diariamente.

São ativos, portanto. Têm liberdade, entram e saem da sala da coordenação, se manifestam, opinam, reclamam quando algo não está muito de acordo com o que desejam (eles desejam!). São conscientes de que têm todos esses direitos porque estão vivos, ou vice-versa. Para se ter uma ideia, leio periodicamente o jornal feito por eles, o Sol da Vila. Uma equipe editorial se reúne todo mês, define as pautas, eles mesmos escrevem e a publicação é distribuída impressa e por email. Gosto de responder, de comentar. Já dei até uns pitacos. Detalhe: todos no grupo já passaram dos 90!

E lá fui para um encontro com aquele público lindo, numa tarde de calor intenso, no Rio de Janeiro.

Bati um papo muito agradável, pitoresco mesmo, regado a suco de frutas para aplacar a quentura. Na plateia, expressões atentas: sobrancelhas erguidas, cabeças se movendo negativa ou positivamente, sorrisos, lábios apertados, olhares graves ou sensíveis. Constatei que para aquelas pessoas a idade jamais será empecilho, enquanto houver interesse pela vida, a própria vida, e que por isso as experiências externas serão importantes, porque há espaço para aprendizado e crescimento. A qualquer hora.

Ao final, perguntas, muitas perguntas, outros casos, sugestões. Não só provaram que prestaram a atenção em tudo, como queriam saber mais. E me fizeram lembrar informações que não foram citadas, momentos que passaram despercebidos. Recebi beijos, abraços, palavras de carinho, de agradecimento sincero. Recebi flores. Girassóis.

Então me dei conta de que não fui lá apenas para contar a minha história e transmitir àquelas pessoas a minha experiência. Trouxe de lá outro tanto de referências boas, de exemplos de vontade de viver, de pequenas coisas com um valor enorme.

É a Lei do Retorno dando o ar de sua graça mais uma vez. A gente dá; a gente recebe de volta. Abri meu coração para dar e receber e o resultado não poderia ser diferente: voltei com ele cheio, transbordando de alegria pelo que vi, ouvi, pelo que aprendi. É o que faz a vida ter sentido.
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2 comentários:

gil disse...

... você não te pertence mais ....vá e faça o que tens pra fazer !!!! a recompensa é um vida repleta de luz e encanto !!!!

Kátia Almeida disse...

Lindo texto! Não poderia ser diferente! Levarei hoje para eles este retorno. Fiquei pensando nos girassóis. . .
Eles representam bem a sua postura e também dos hóspedes da Vila do Sol.
Assim como esta linda flor que, não fica passivamente parada esperando que o Sol venha em sua direção, você busca seu caminho na direção de cada vez mais luz.
E os nossos hóspedes? Esses aproveitam avidamente todas as possibilidade de luz que disponibilizamos a cada dia para eles.
Kátia Almeida (Psicóloga da Vila do Sol)