Sonhei que estava fumando. Acendi um cigarro enorme – talvez mais que o dobro do tamanho normal – traguei fundo, ansiosa, e soprei com gosto, ô,
delícia! Sabia que estava sonhando e por isso não senti culpa ou
arrependimento. Tragava com vontade, soprava a fumaça e curtia aqueles breves
momentos. Acho que ando com muita vontade de fumar, inconsciente, e nos sonhos
satisfaço desejos ocultos no fundo da mente.
Segundo alguns profissionais com os quais já conversei
informalmente a respeito, o viciado em cigarro é praticamente igual ao viciado
em álcool: ele é adicto, para sempre, e por isso deve evitar o primeiro trago.
Já no espiritismo se ouve dizer que é necessária mais de uma reencarnação para
se libertar de vez do vício em cigarro. Se for assim, o negócio é mesmo
punk. Preciso estudar melhor esta parte.
Fumei por muitos anos por puro prazer, porque fumar é
gostoso: depois do cafezinho; após o almoço; ao chegar do trabalho, estirada no
sofá; na mesa do boteco, acompanhando copos e copos de cerveja e em conversa
com um monte de gente falando ao mesmo tempo; escrevendo, enquanto ele queima
sozinho no cinzeiro (a gente dá o primeiro trago profunda e gostosamente, ele
vira cinza e quando está perto do filtro se dá outro trago, naquele momento em
que se tira o olho da tela para raciocinar uma ideia ou frase, buscar uma
palavra na memória).
Porém, fora a delícia de puxar a fumaça pra dentro e
soltá-la em seguida, nada há de agradável no dia a dia de quem fuma. Por
exemplo: não suporto o cheiro que fica impregnado por toda parte quando há
fumantes por perto. Quando a gente fuma, não se dá conta do fedor de cigarro na
pele, na roupa, no cabelo. Isso não quero mais pra mim. Acostumei-me a estar
perfumada, algo que não acontecia quando fumava. Também não me animo a
frequentar ambientes em que há pessoas fumando: fica-se com cheiro de cigarro
até na calcinha e na meia. O tal parece ter poderes extrassensoriais: vai ver atravessa
até parede de chumbo, credo!
Cheiro de cigarro, para quem não fuma, percebe-se de muito
longe. Sinto-o passar diante do nariz, no meu carro em movimento; também
detecto corpos impregnados a metros de distância; se estou na sala de casa, com
as janelas abertas, e passa alguém fumando na rua, posso sentir; de dentro de
um restaurante ou bar, é certeiro: os fumantes saem para fumar na calçada e a
fumaça é empurrada de volta pra dentro. Pelo menos em sonho, pode-se fumar sem
culpa e sem cheiro. Satisfaço meu desejo sem incomodar ninguém e sem detonar a
minha saúde física.
Parei há cerca de dez anos (não faço contas) e nunca mais experimentei
o sabor de um trago. Não nego a vontade em muitos momentos, como agora, depois
de um café com biscoitos, ao lembrar o sonho. Admito e me resigno com a
dependência, por isso não me arrisco ao primeiro trago. Por outro lado, tenho
plena segurança de que fumar é uma das poucas de que me arrependo ter
feito na vida. E tenho plena certeza de que parar foi um acerto. Contento-me
com os sonhos.
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