6 de junho de 2016

VI Bienal Rubem Braga

Passava pouco das oito da manhã quando cheguei e logo percebi que a noite por ali não tivera fim. Entrei lentamente pelo portão, como havia me programado, para matar a saudade do lugar com calma. Porém, o que imaginei ver enquanto entrava a passo leve, estava bem longe da realidade: a água pesada que caíra sobre a cidade na noite anterior só não destruiu por completo, mas causou danos e obrigou praticamente toda a equipe a virar a madrugada trabalhando duro.

O que avistei quando cheguei foram estandes vazios, salas e cadeiras sendo enxutas, um movimento de recuperação de tudo o que fosse possível, para fazer a festa acontecer. Afinal, o mestre estava ali abençoando novamente o grande encontro literário de Cachoeiro de Itapemirim, e não deixou que o ânimo esmorecesse.

A VI Bienal Rubem Braga teve início na terça, dia 31, e na noite de quarta foi pega de surpresa por um temporal que arrasou toda a cidade. Muitos desabrigados e desalojados, ruas cobertas de lama, inúmeras famílias sem seus pertences, destruídos pelas águas.

Na Praça de Fátima, a mesa de debates “Os dilemas das Identidades de Gênero na Construção de Personagens Literários”, com João Paulo Cuenca, Andrea Del Fuego e Milena Paixão, teve de ser interrompida, e as perguntas do público que insistiu em ficar foram respondidas no camarim. A mesa para a qual fui convidada, seria na manhã seguinte.

Por que comecei relatando justamente o outro lado desse evento singular?

Para exaltar a galhardia com que a equipe organizadora não só faz acontecer, como não se deixa abater e dá a volta por cima: mexe aqui, recoloca ali, limpa, lava, enxuga, transporta, remaneja, respira fundo e põe a engrenagem pra rodar, com um invariável sorrisão na face.

Logo chegam os ônibus lotados de estudantes para as atividades do dia e eles podem ser recebidos com a mesma alegria de sempre. Assim foi o terceiro dia da VI Bienal Rubem Braga, um evento do qual me orgulho de ter participado pela segunda vez. Realizada pela Secretaria de Cultura do município, faz merecida homenagem ao cronista nascido por ali, onde corre o rio Itapemirim.

Este ano teve Zezé Motta e Wilson Coelho na mesa de abertura, e muita gente com muita coisa boa a dizer durante a semana: Sérgio Vaz, Marcelino Freire, Paulo Lins, José Eduardo Agualusa, Gonçalo M. Tavares, Jorge Nascimento, Carol Bensimon, Saulo Ribeiro, Sara Passabon, entre tantos outros. Ao longo de todos os dias as crianças foram presenteadas com contação de histórias, teatro de fantoches, oficinas, feira de livros, muita música e performances como a do cão Zig, da Borboleta Amarela e do Entregador de Palavras.

Na mesa da quinta-feira estavam comigo Babi Dewet e Felipe Castilho, escritores que em seus livros falam para o público jovem e se comunicam com essa galera pela internet. De manhã e à tarde recebemos estudantes de oitavo e nono anos e de ensino médio para conversar sobre “Leitura, Literatura e Internet”, e saímos no fim da tarde com a sensação de ter aprendido não só entre nós, com nossa troca de informações, como com aqueles garotos e garotas ávidos, de olhos brilhantes, encantados, carregados de questões.

A Bienal terminou ontem, com o show da Bia Bedran, e como sempre deixa o conhecido desejo de ‘quero mais’. Os incansáveis trabalhadores da cultura de Cachoeiro de Itapemirim, acolhedores como se nos recebessem em casa, tornam-se ‘amigos de infância’ nas redes sociais e outros novos amigos surgem para trocar ideias sobre literatura e não deixar nunca o assunto morrer. “Minha alma canta” quando vejo o Rio de Janeiro pela janela do avião, mas um pedacinho do coração fica por lá.  
    

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