O relógio
despertaria às 6h, horário em que somente os santos despertam, porque têm de
render a turma de proteção dos mortais que trabalhou na madrugada. Fora esses,
ninguém mais merece sair da cama antes de o sol dar as caras.
Além da hora
ingrata, soma-se o compromisso de trabalho, a ansiedade, a expectativa, estar
fora de casa, sozinha num quarto de hotel, colchão e travesseiros estranhos.
Tudo conspirando para uma noite de batalha entre o sono e a espera pelo dia
seguinte.
Uma hora:
sede.
Uma e
quinze: estrondos na rua, parecidos com tiros.
Uma e vinte:
abrem-se janelas no andar de cima.
Uma e
trinta: o hóspede do quarto ao lado chega e liga a TV.
Ele não quer
se sentir só. Quer a companhia da televisão e, ainda, compartilhar seu programa
comigo, talvez com todo o andar. No meu caso, o agravante é que a TV parece
estar na parede que nos separa. E então, o apartamento inteiro vibra quando
rola a vinheta daquele telejornal exibido para as corujas.
Tenho dificuldade para dormir. O sono é leve: não rola com ruído, luz, movimento. Levanto para beber água. Viro pra lá e pra cá, a ponto de jogar travesseiro e lençol pra fora (tudo bem, já me orientaram a consultar um neurologista). Limitações pessoais à parte, convenhamos: uma e meia da manhã é hora de quê? De deixar a vizinhança dormir em paz.
Como ia
dizendo, o quarto inteiro vibrava ao som da vinhetinha do telejornal. Todas as
notícias do dia eram repetidas, enquanto pensava numa forma de tentar ludibriar
o desconforto, pois, caso contrário, já sabia com que cara enfrentaria as
dezenas de olhinhos curiosos da oficina de crônicas que começaria às oito.
Fala sério!
Minha mãe
sempre ensinou que é feio incomodar os outros. Parece que só ela e mais meia
dúzia passaram a lição aos filhos, porque o que mais vejo hoje em dia é gente
com os olhos baixos, admirando o próprio umbigo e com fones nos ouvidos. F-se o
mundo! Eu e somente eu sou importante!
Inacreditável
alguém que chega a um quarto de hotel e, sem pensar em ninguém, liga a TV
naquela altura. E você deve estar querendo saber como terminou meu sofrimento,
né?
Pois bem: após
bater cinco vezes seguidas com uma latinha de cerveja na parede, a pessoa do
lado de lá reduziu o volume. Só um pouquinho. Entre incomodar o funcionário do
hotel para pedir providências e aguardar pacientemente até que o cidadão ou
cidadã resolvesse dormir, escolhi a segunda opção. Ouvi o telejornal inteiro e
o programa seguinte até três e meia da manhã, quando, enfim, o silêncio voltou
a reinar. Ajeitei o travesseiro, puxei o edredom e chamei Morfeu.
Apenas não pensei
na possibilidade de esbarrar nele a qualquer momento, o que me rendeu boas
risadas, sozinha, a cada vez que tive de, digamos, me esconder. Só eu, mesma.
Só eu.
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