Já rosnei
muito. Do tipo que não podia ser contrariada. Sério. Brigava contra qualquer
ponto de vista que não fosse o meu. Manja dona da verdade? Impunha, batia o pé,
não aceitava oposição. Quando não podia bater boca pela minha brilhante
opinião, remoía dias, até quase sufocar de raiva. E rosnava.
Chatinho,
isso. Tão chatinho, que olhei pra dentro e me deparei com uma pessoa
insuportável e não pude mais me tolerar. Afinal, quem aguenta conversar cinco
minutos com alguém que rosna para se impor, ao invés de discutir ideias?
O tempo deu
uma acelerada, anos se passaram, recolhi e reciclei minhas energias animalescas.
Mudei de ares e de rumos e hoje consigo observar de longe comportamentos bem
semelhantes. Não me libertei de todo, mas ganhei autocrítica suficiente para
não mais rosnar para quem quer que seja.
Da mesma
forma que não me tolerei, tornei-me intolerante com qualquer pessoa que mostre
os dentes para não sorrir. Ou que esconde atrás do sorriso um animal raivoso. E
lamento muito o tanto de gente que conheço assim.
Nesta época
de campanha eleitoral, por exemplo, é muito comum encontrar gente que rosna a
cada esquina, em cada mesa de bar, em milhares de posts nas redes sociais. Todos
os dias, várias vezes ao dia, recebo emails não solicitados com um grrrrrrr no
campo do assunto. E falo de pessoas letradas, privilegiadas com a oportunidade
do estudo, ou seja, teoricamente preparadas para emitir opiniões, discutir em
bom nível, porém vencem um cão acuado, com mérito. Não falam. Vociferam, berram,
só falta sapatearem feito criança pirracenta: “Eu estou certo! Você tem que me
dar razão”.
Não. Parei
de dar atenção. Antes até tentava conversar, dizer calmamente que penso diferente,
como penso e porque penso; porque pensar diferente é normal. Nem isso entendem,
infelizmente. Porque sequer ouvem. São mesmo como bichos, que só rosnam.
Queria, de verdade, saber o que têm a dizer, ouvir suas opiniões, juntar as
deles com as minhas e, quem sabe, chegar a algo novo. Mas, com quem rosna não se
chega a lugar algum. Quem rosna não sai do lugar. Fica ali, mostrando os
dentes, babando, estático, esperando que o mundo lhe dê um afago ou um chute,
sei lá.
Hoje me
recolho ao silêncio. Assisto com certa distância a esses destemperos e só
encaro debate com quem está mesmo a fim de discutir ideias, não pontos de
vista. É mais saudável, mais produtivo, mais criativo e, com certeza, resulta
em algo que realmente valha a pena.
Tive uma
aluna da faculdade que rosnava. Era até engraçado, porque sempre manifestava
certa raiva ao falar sobre alguns temas específicos. E pensava, sim, que
mudaria o mundo com sua agressividade. Dizia a ela: “Para de rosnar; apenas
fale. Você não precisa disso. É inteligente e pode discutir suas ideias em
nível melhor”. O curso superior e as experiências que juntou lhe fizeram muito
bem. Pelo menos soube aproveitar o que os bons livros nos propõem. É o que
penso. Mas não precisa pensar como eu..
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3 comentários:
Gente que se acha "Dona da verdade" é horrível mesmo. Outra coisa que detesto é gente que nunca concorda com nada, o famoso "do contra". Gente assim tem que morar no meio do mato, e sem a companhia de ninguém. À propósito, gostei da metáfora.
Texto bem interessante. Parabéns
Rosna, late e não morde. Curti a crônica!
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