Impossível fugir do assunto. Creio que nunca mais vou
parar de falar nisso. E o motivo é basicão: importante, importantíssimo. E
começo contando uma conversa recente com minha mãe sobre saúde, visitas
regulares a médicos, informação. Ela falou de uma amiga que sofre uma série de
sintomas que, normalmente, a deveriam levar a um especialista. Mas, não. Não
quer saber de médico, não se importa; ou foge, nega, toca a vida normalmente
(!). Diante do meu espanto, minha mãe emendou com esta: “Minha filha, você sabe
de nada. Conheço muita mulher da minha idade que nunca foi a um ginecologista;
e nem vai.” Mamãe tem quase 80 anos.
Mesmo fazendo autoexame regularmente, quando descobri que
estava com câncer, soube também que ele era bem grandinho, longe do que é
esperado num diagnóstico precoce. E as providências urgentes permitiram
livrar-me dele logo nas primeiras sessões de quimioterapia. Sem entrar na
questão da dificuldade de acesso a tratamentos pela população de baixa renda,
ao ouvir a assertiva da minha mãe consegui entender, finalmente, que as
campanhas de prevenção são pra lá de necessárias, porém estão longe de alcançar
resultados realmente satisfatórios. É duro dizer isso, mas muitas mulheres
ainda morrem de câncer por opção. “Elas não querem, não sabem, sei lá, às vezes
até sabem, mas não estão a fim de ir atrás de tratamento”, minha mãe completou.
Sinto dizer que é verdade. Quando vivi esta experiência conheci bem de perto histórias variadas de
outras mulheres. Sucessos, insucessos e as fugas, claro. Numa de minhas primeiras
consultas com o mastologista, ele teve de me deixar aguardando uns minutos,
pois precisava falar ao telefone. Não pude deixar de ouvir: “Dona Fulana, é o
doutor Eduardo, tudo bem? A senhora sumiu daqui. A gente precisa se ver de
novo, tenho que ver os seus exames e a senhora não pode ficar sem se tratar
(...)”. Quando retornou, tratou logo de explicar que a tal paciente era uma
entre muitas que, à primeira suspeita de algo mais nos exames, desaparecem dos
consultórios.
Soube também de duas outras mulheres conhecidas do
maridão, que depois de diagnosticadas resolveram simplesmente negar. Não
fizeram tratamento, não foram mais ao médico, não tocaram no assunto e tchau. A
justificativa de ambas era bem parecida: sofrer com a quimioterapia, perder o
cabelo, quase morrer de enjoos (e não de câncer), não comer, perder peso, ficar
mutilada, e tudo isso sem a certeza de sair curada após tantas dores. E esta
incerteza existe mesmo. Infelizmente lidamos com o imponderável todo o tempo.
Mas a própria vida é imponderável, afinal, quem de nós sabe se vai terminar o
dia vivo?
Há ainda as que não chegam a negar, mas preferem a
passividade à ação, por motivos vários. Boa parte dessas, por exemplo, se
recusa a se submeter à quimioterapia, pois não querem “tomar veneno com
monitoramento médico”, como diria uma amiga da área. E apostam no ‘deixar
rolar’. Sinceramente, não conseguiria (e não o fiz) não tomar providências
rapidamente ao ser diagnosticada de doença tão grave. Passar meses, anos,
deixando rolar, não dá. Pra mim, se há solução, então, borá lá resolver isso
ontem.
As amigas da minha mãe – ou conhecidas – não moram na
roça. Estão aqui, perto de nós. Veem TV todos os dias, vão ao supermercado, ao
shopping, ao cinema. Namoram ou são casadas, têm filhos, netos. Participam das
ações sociais oferecidas na cidade para a população idosa. Mesmo assim, não há
campanha de prevenção de câncer que as faça procurar médico, estejam ou não com
algum sinal de doença. Outras podem estar fazendo o que faz a paciente do meu
mastologista. Sabem que tem um problema a tratar e além de escaparem, ninguém
da família é informado. Pode ser sua amiga, prima, sobrinha, sua irmã, sua mãe,
sua filha.
5 comentários:
Realmente, existem muitos casos como os que você postou. O medo e a vergonha são os maiores vilões dessas situações. É como se um grilhinho fala-se a seu ouvido..." olha você vive a tanto tempo sem saber, e vive bem, deixa isso pra lá, quantas pessoas que voce conhece que recebem o diagnostico, e não duram nem um mês..." elas morreram justamente na maioria das vezes por medo de se cuidar, e ainda infelizmente nao encontraram uma forma, para que as campanhas de prevenção sejam eficazes. Beijos como sempre maravilhoso ler o que você escreve.
Conheci uma Engenheira em 2001 ou menos, que me falou q já tinha muitos anos que não fazia preventivo, porquê era limpinha e confiava no marido!!Minha nossa, quase dei um troço, mulher estudada!!!Falei, minha querida agente já vem com o "pacote", só não sabemos se vamos desenvolver a doença ou não!!Ela disse, que isso, me olhou com uma cara!!Vai vendo aí!!
Por email:
"Oi Giovana,
Sei muito bem o que é isto. Acompanhei de perto o desenrolar e o final triste de histórias assim.
Perdi duas amigas muito íntimas e sofri com o fato de saber que uma não ia ao gineco e quando diagnosticada a coisa já ia pra lá de feia e desencarnou.. a outra, embora não fosse caso de gineco, quando foi informada do diagnóstico negou! E ainda confrontou o diagnóstico perante o médico! E negou, negou e desencarnou... Isto há pouco tempo. Não é caso de desinformação, mas de negação! Mas respeito a posição delas(que estejam em paz), pois cada um reage ou deixa de agir de acordo com as forças que tem!
bjs,
Henriéte"
otimo texto. Queria saber por que as mulheres evitam o ginecologista?!
Nem dá pra acreditar, ne?
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