Reclamo muito da (falta de) educação no trânsito. Vira e
mexe esbravejo contra impacientes, apressadinhos, ansiosos, donos do mundo, que
sempre pensam que suas prioridades estão acima dos direitos dos outros. Porém,
esta semana, voltando do trabalho para casa bem devagar por conta de uma
enxaqueca que mal me permitia o raciocínio, acabei atrás de um carro de
autoescola, local que ninguém gosta de permanecer por mais que meio segundo.
Pois ali fiquei e nem mesmo a forte dor de cabeça me atrapalhou a observação do
festival de impropérios contra o estreante na arte de dirigir um automóvel.
Aceleração exagerada, gestos, palavrões, buzina, buzina e
mais buzina. Cada um tinha um motivo muito justo para ficar exasperado, a ponto
de cuspir marimbondos e abelhas à vontade, como se estivesse sozinho no alto de
uma montanha. Mas nenhum deles está. Não só circulam por um espaço que é
coletivo, como se esquecem que um dia estiveram naquela situação, a de
aprendiz, num carro de autoescola ou em veículo particular, ensinados por pai,
mãe, irmão, namorado, tio, amigo. E não custa nada lembrar o tamanho da
insegurança que se sente nesta hora e que o cara precisa andar devagarzinho,
como um dia fizemos também.
Era muito criança ainda quando acompanhei as aulas da minha
irmã na autoescola. O instrutor chegava, buzinava, saíamos minha irmã e eu e
ela assumia o volante. O passo a passo seguido a cada dia, até que ela
conseguisse fazer o carro simplesmente andar, não foi algo que ocorre como num passe
de mágica. Quem já dirige há muitos anos se esquece da confusão que se faz, nos
primeiros momentos, para dar conta de tantos comandos ao mesmo tempo. Achava
engraçado o instrutor dando as orientações. Ele falava cantando, bem devagar,
como se estivesse ensinando uma retardada. Tive esta mesma experiência anos
depois, quando encarei aulas numa autoescola e fazia questão de dizer a ele que
não precisav a cantar pra mim. Mas
antes disso, conheci o volante de um veículo de outra forma.
Meu primeiro contato com a direção foi aos 16 anos, num
caminhão Mercedes 1313. Namorava um caminhoneiro e ele resolveu que eu
aprenderia a dirigir aquela coisa enorme. Não sei se foi trágico ou cômico meu
primeiro contato com aquele volantão, mas a verdade é que, literalmente aos
trancos, consegui fazer o caminhão sair do lugar. O pior é que num veículo
deste tipo, não há o conforto de chegar a poltrona para a frente para os pés
alcançarem os pedais, muito menos ajustar o encosto. É sentar, ligar e botar o
negócio para rodar. E foram memoráveis as aulas; ganhei destreza nos comandos,
desenvolvi meus reflexos e pude aprender rapidamente a controlar o veículo,
pois pelo tamanho, o risco era maior e não havia tempo pra pensar.
Quando finalmente encarei as aulas regulares de uma
autoescola, não digo que foi mais fácil, mas passei batida pelas primeiras
lições, nas quais o instrutor cantante mostra onde ficam os comandos do carro,
para quê existem e como funcionam. Liguei o carro, engatei a primeira e bora
lá. A grande e temida diferença é que ele, sabendo do meu adiantamento, me
levou direto para as ruas centrais da cidade. Quase cristalizei.
Dirigir é um ato de risco, pois ao contrário do que pensa a
maioria dos condutores, envolve o motorista, seus caronas, os outros
motoristas, os outros caronas, motociclistas (cuja maioria também se sente
prioritária), ciclistas, pedestres, animais. Qualquer m* que fizerem, podem
arrebentar com a vida alheia. E nem sei por que fico aqui relembrando isso;
todo mundo sabe, ou deveria saber.
O fato é que passar alguns minutos assistindo ao aperto do
futuro motorista me fez voltar lá atrás e rever os apuros que eu
mesma passei. Quando finalmente pude ultrapassá-lo sem estresse, arrisquei uma
olhadinha e ali estava um jovem, com os olhos fixos à frente, suando, expressão
tensa. “Poderia ser meu filho”, pensei, “e gostaria muito que tivessem
paciência com ele também”.
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4 comentários:
ola giovana
realmente, se as pessoas tivessem um pouco mais de educação e respeito pelo próximo o trânsito e os pedestres, principalmente, teriam mais 'paz'. A consciencia não deveria vir só deles, carros e pessoas, mas também dos motociclistas e motoristas de ônibus, que com pressa esquece dos direitos de todos.
Giovana, o trânsito é um bom exemplo desta falta de educação e falta de respeito ao próximo. Infelizmente, algumas vezes as consequências destes atos são desagradáveis. É preciso cuidar mais.
Beijoca.
Você fez o que muitas pessoas não fazem hoje em dia: se colocar no lugar do outro. Um "e se fosse comigo?" poderia mudar muitas coisas no nosso dia a dia...
Se as pessoas tivessem mais educação no trânsito seria muito diferente!
Já contei minha experiência, quem quiser ver:
http://blogdasibucs.blogspot.com/2007/09/consegui.html
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