O que vi nos dias de Festa
- A 9ª edição da Festa Literária Internacional de Paraty, que homenageou Oswald de Andrade, teve este ano 139 escritores convidados, sendo 29 nomes internacionais. Segundo a organização da Flip, 25 mil pessoas estiveram por lá e mais de 40 mil ingressos foram vendidos para as mesas de debates, assistidas na Tenda dos Autores e na Tenda do Telão.
- Dados oficiais revelam o sucesso incontestável da Festa, mas mesmo assim observei que havia menos gente, não sei se por causa do frio (como fez frio em Paraty!) ou por outro motivo que ainda não sei. Mas, em comparação com todas as outras que participei, desde 2007, notei certo esvaziamento. Na quinta e sexta-feira, por exemplo, a Tenda do Telão tinha muitos lugares vazios durante as mesas, algo que não vi ocorrer nas edições anteriores. O espaço era tão concorrido que o público disputava lugar até do lado de fora da tenda, para assistir aos debates em pé. E isso também não aconteceu neste ano, nem mesmo no sábado, dia de maior movimento em Paraty.
- De tudo o que pude ver por lá gostei demais da participação do neurocientista Miguel Nicolelis, que no dia 7 debateu o tema “O humano além do humano” com o filósofo Luiz Felipe Pondé e mediação de Laura Greenhalgh. Um papo riquíssimo, do qual tirei pérolas do tipo:
“O sentido da vida é como uma maldição. Ninguém escolhe ter. Uns têm; outros não têm. Algumas pessoas têm porque fazem alguma coisa; e outras têm justamente porque não fazem nada”. – Pondé
“... a gente faz umas coisinhas melhores atualmente”. Nicolelis, a respeito do que conhecemos por milagre.
“A vida é um escândalo. E sempre dá errado no final”. – Pondé
- Absorvi muito do debate entre os jornalistas Edney Silvestre e Marcelo Ferroni e o escritor Teixeira Coelho, com a mediação de Claudinei Ferreira. O tema “Literatura entre escombros”, no dia 9, tratou da tendência comum de se escrever obras sobre tragédias, depressões, fatos ruins. E acabou falando-se muito sobre felicidade, o que para Teixeira Coelho é perfeitamente possível. E ele fala disso no livro O Homem que vive – uma jornada sentimental.
- Uma mesa que tinha tudo para ser uma das melhores ficou pela metade, na minha opinião. Arthur Dapiève não era a pessoa ideal para entrevistar James Ellroy. O cara é excêntrico, histriônico, sarcástico e algo mais que tudo isso; enquanto Dapiève é sério, fleumático, duro. Não deu. Ellroy precisava de alguém mais descolado, flexível, que entrasse num jogo inteligente e não ficasse no que vi: uma entrevista ping-pong formal, na qual o entrevistador perguntava, o entrevistado respondia e nada além era explorado. Saí antes de acabar.
- Nas ruas, autores e outras figuras deram o ar da graça. Ancelmo Gois andou por Paraty sem descanso na quinta e na sexta. Abraçou muita gente e distribuiu sorrisos. Inácio Loyola Brandão também estava muito à vontade. Passou uma tarde no café da Tenda dos Autores, participou de uma mesa, assistiu a várias outras, circulou muito pela cidade e ainda foi visto num papo pra lá de animado numa esquina do Centro Histórico de madrugada. Luiz Felipe Pondé também curtiu altos papos em altas madrugadas.
- Nesta edição da Festa toda a programação principal foi realizada do outro lado do rio Pereqê-Açu, por causa da ordem do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - Iphan de não montar tendas ao lado da Matriz de Nossa Senhora dos Remédios, como nos anos anteriores. Ao lado da igreja, só a tenda da Flipinha. O resultado foi perfeito. Todas as tendas foram montadas ao longo da margem do rio, como um centro de convenções, terminando já na areia da praia do Pontal. Atrás da Tenda dos Autores ficou a livraria e a mesa de autógrafos. Em seguida, num grande corredor, a loja da Flip, os stands da CPFL, Suzano Papel e Celulose, BNDES, revista Piauí e o Café da Folha de São Paulo. Andando um pouco mais se chegava à Tenda do Telão. Tudo isso em uma inteligente e bonita intervenção na recém-urbanizada beira-rio, que só posso dizer que está lindíssima.
- Outro dado interessante: muitos eventos alternativos à programação principal encheram a agenda de quem foi à Paraty interessado mesmo em literatura. Teve debate na Casa da Folha de São Paulo e na Casa do Jornal do Brasil. A Revista Imprensa também organizou seu próprio evento, além dos saraus que pipocaram por todos os cantos. Teve ainda a programação da Off Flip e a Casa do Clube de Autores, onde participei com um bate-papo sobre autodivulgação para novos autores independentes, na tarde do dia 8.
- Claro que observei outras coisas por lá, que renderiam até crônicas, mas estou com pressa de contar tudo aos meus leitores. Tinha aquele pessoal que estava lá, mas não sabia bem o motivo. Ouvi uma mulher dentro da livraria “eu queria comprar um livro”, com a entonação de quem estava em qualquer outro estabelecimento, menos numa livraria. Quase respondi “infelizmente aqui só se vendem calcinhas”.
- Não faltaram também, é lógico, os incontáveis escritores que vendem (ou tentam vender) suas obras pelas ruas, nos bares e restaurantes, por qualquer preço que o transeunte queira pagar a título de colaboração. E por mais que eu apoie as iniciativas independentes, houve momentos em que me enchi um pouco disso. Estava demais.
- Como já disse antes, em outro texto, Paraty parece que abriga duas cidades ao mesmo tempo. Junto ao evento internacional, fomos presenteados pela Festa de Santa Rita, que levou à quadra da Praça da Matriz shows com as bandas de ciranda. E aí, caro leitor, a noite demorava muito para acabar.
- Pra terminar, preparem-se para 2012. O próximo homenageado já foi definido e será Carlos Drummond de Andrade. O presidente da Casa Azul, Mauro Munhoz, pediu para que não entendamos como slogan o verso 'tinha uma pedra no meio do caminho'. Mas achou boa a ideia.
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4 comentários:
Adorei!
Passeei com vc nesse post.
Adorei! Passeei com vc neste post.
Aliás, adorei meus mimos.
Bjaum
Eu ressaltaria mais duas observações: uma positiva, outra negativa. A primeira é valter hugo mãe. Brilhante na mesa de debates, ele tem um texto muito envolvente e pra mim foi a melhor surpresa da Festa. A segunda são os preços dos livros. No ano passado não tive a curiosidade de comparar os valores com os de outros locais. Esse ano eu pesquisei e o resultado foram variações de até 45%. Incentivo à leitura?!
...Com este comentário e as reportagens da Fernandinha Sayão no DV, nem precisava ir lá! Mas eu fui e concordo com vocês duas. Valeu!
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